segunda-feira, 1 de março de 2010

Carta de Juan Carlos - Março 2010

Deserto vocacional

Caros amigos e amigas:

Quem se dedica à animação vocacional na América e na Europa sabe o que é o deserto vocacional: é a nossa paisagem quotidiana. Há já algumas décadas que cultivamos em terreno pedregoso, onde a colheita se resume a quase nada. Por vezes, deambulamos sem mapa nem bússula, outras vezes , sem forças nem motivos.
Uma aridez asfixiante seca os nossos entusiasmos mais resistentes. Não recolhemos frutos razoáveis, de acordo com a sementeira, que em muitos lugares foi abundante. «De cima» não chega nada. Os milagres não existem. Cansados de semear por areias tão escaldantes e com escassos oásis..., vão florescendo as tentações. Não são três, são muitas: abandonar a pastoral vocacional; acusar quem quer que seja (os jovens, os nossos irmãos de caminho, a sociedade, o governo...); culpabilizarmo-nos pensando que somos uma geração sem valor, e talvez estejamos a escrever a página mais medíocre da história claretiana; questionamo-nos sobre a nossa própria vocação.
Esquecemo-nos que o deserto é o lugar onde começa toda a aventura espiritual digna desse nome. Basta mergulhar na bíblia para o descobrir. Foi lá que Jesus começou o seu ministério vocacional. A espiritualidade do deserto, para quem sabe esperar é mais fecunda do que possamos imaginar. Mas não é automática. A liturgia da quaresma ensina-nos a descobrir esta forma de paciência. A quem sabe aguentar, o deserto revela o seu segredo: «o significado último do deserto é criar sede» (Saint Exupery). É o laboratório onde a vulnerabilidade, a tentação e a prova, se transformam numa saudável purificação da nossa eficácia. Ali purificam-se as intenções. O deserto leva-nos ao essencial, centra-nos no único necessário.
Quem ajudará os nossos animadores de pastoral vocacional a entender que o deserto tem saída? Quem, entre eles, acredita que uma sã dieta de deserto é imprescindível para fazer pastoral vocacional a partir do coração de Deus… para confiar, para fazer a sua obra e não a nossa…? Mas atenção. O deserto acaba com tudo o que não seja autêntico: ou cura ou… mata!
Por isso e apesar de tudo não digamos mal do deserto. Foi lá que se curtiram os profetas de ontem e de hoje. Não façamos mudanças.
A animação vocacional exige uma longa paciência e o desalento é a maior cobardia. É tempo de resistir. Não podemos deixar que a secura ou a falta de frutos imediatos nos detenham. Não acreditamos em Jesus que lutou no deserto e dali saiu vivo e inteiro com a força do Espírito? Será que nos deixamos manipular por uma cadeia de decepções? Sim, é verdade: os que dizem que perdem a fé, é porque nunca a tiveram. E os que perdem a fé nesta tarefa é porque nunca a valorizaram devidamente.
Trabalhar pelo êxito, trabalhar pelo prémio é apodrecer. Sim, é bom que o prémio chegue de vez em quando, pois o coração humano é de carne e não de aço. Mas nós deveríamos viver como as chamas, que nunca perguntam se é importante o que estão a queimar.

Vosso amigo

Juan Carlos, cmf

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